Paul Arroz de Festa McCartney

O Joaquim Ferreira dos Santos exagerou. Logo ele que tem Paul como o seu beatle predileto. Pode até ser que a vaidade de Macca seja maior do que a sua franja topetuda, mas é maldade dizer que “Paul McCartney 3, 2, 1” é o “maior vazamento de ego da história do pop”. Lizzie Bravo certamente entenderia o beatle que a convidou para gravar o coro de “Across the Universe” e aquele que, depois de conferir seus livros escolares para ver como a estudante brasileira de 15 anos de idade estava indo em seus estudos na Londres de 1967, lhe emprestou um gravador para que ela ouvisse uma fita com notícias de casa. Lizzie saberia também identificar no novo documentário de McCartney a deferência com que ele trata seus companheiros de trampo quando jovem.

No próprio trailer da série (que pode ser vista em seis episódios de meia-hora em streaming da Star+, canal do grupo Disney), Macca aponta as qualidades de Ringo e como seu estilo característico foi fundamental para o grupo. Menciona ainda a introdução de “And I Love Her” como uma dentre as muitas contribuições de Harrison para o quarteto. Houve desentendimentos é claro, alguns deles sérios, principalmente com George Harrison, o que é normal para pessoas que conviveram por 10 anos. Mas não há por que se estranhar que um multi-instrumentista talentoso, um dos grandes baixista da história da música e que acabou por acaso tendo esse encargo nos Beatles (ninguém queria ocupar a posição), deseje vez ou assumir as baquetas em “Back in USSR” ou a guitarra solo em “Taxman”.

Seguindo um pouco o modelo do programa “Classic Albums” (exibido pela BBC, VH1, ITV e outras emissoras a partir de meados dos anos 1990), Macca, que é o produtor da série, passa em revista e dá detalhes sobre sua trajetória em conversa com o produtor Rick Rubin. Fala tanto sobre as gravações que fez com os Fab Four como conta os detalhes sobre os discos de sua carreira ao lado dos Wings. A escolha do largadão Rubin, que deu vida aos discos de nomes de latitudes musicais tão distintas quanto Beastie Boys, Strokes, Shakira, Kula Shaker, Slayer, The Cult, Tom Petty e Johnny Cash, acresce um ar novidadeiro à série. Dá pra maratonar tudo de uma sentada só, especialmente porque o roteiro vai e volta no tempo quebrando uma linearidade que podia tornar tudo insuportável.

Macca comenta a sua admiração pelo nigeriano Fela Kuti no período dos Wings e relembra os apertos das gravações que fizeram em Lagos em 1974. Muito antes portanto deste tipo de iniciativa despertar o interesse de Paul Simon, Peter Gabriel e, depois, do mundo. Em outro momento, trata também de músicos como Little Richard, Everly Brothers, Chuck Berry, Beach Boys e Bach, como aqueles que inspiraram muitas das composições e arranjos do quarteto de Liverpool. Minimalista em sua concepção, o programa coloca Rubin com seus comentários sempre pertinentes se servindo, em um ambiente sóbrio e despojado, apenas de uma mesa de som. McCartney, por sua vez, recorre apenas a piano, violão e baixo, para revisitar suas composições. Talvez o problema do biógrafo de Zózimo Barroso do Amaral tenha sido o excesso de expectativa em relação a seu beatle favorito. Como as preferências de Lizzie eram pelo quatro-olhos e não pelo peito de pombo, ela certamente seria mais benevolente com Paul.

Sobre Marcos Pedrosa de Souza

Marcos Pedrosa de Souza é professor da Fundação Cecierj. Tem formação em jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e em letras pela Universidade Santa Úrsula. É mestre e doutor em letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi colaborador de O Globo e de outros jornais e revistas. Foi professor do IBEU, da Cultura Inglesa e da Universidade Estácio de Sá.
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