Cannes, Direto do Palais des Festivals

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Cannes surpreendeu a todos esse ano. Imagino que não seja o único que tinha curiosidade em saber como era a movimentação no balneário francês durante a realização de uma das mais importantes e respeitadas mostras competitivas de cinema do planeta. Sempre acompanhávamos de longe o festival e apenas pelo que líamos nos jornais com as fotos no tapete vermelho, as resenhas dos críticos sobre os lançamentos cinematográficos, as entrevistas coletivas, todo o burburinho causado por diretores, atores, roteiristas, jurados, e a festa da premiação com seus erros e  acertos.

Para sua 69a. edição, encerrada domingo passado, os organizadores nos brindaram com registros em tempo real que colocaram o cinéfilo acompanhando toda a festa bem de perto. As gravações seguem disponíveis para os interessados (links acima). Só faltou mesmo vermos os filmes propriamente ditos. Quem sabe não se faz um pay-per-view para isso no futuro?

Pra quem acompanha com gosto as carreiras de Woody Allen e Jim Jarmusch, o festival chegou com a promessa de apresentação dos novos filmes de dois dos mais gabaritados autores/diretores em atividade. Allen fazia a première de seu “Cafe Society”, fora da mostra competitiva como de costume já que o diretor não comunga com a ideia de disputa entre filmes, e Jarmusch a de sua nova obra, “Paterson”, que concorria à Palma de Ouro e, ainda que muito elogiada, não conseguiu levar o prêmio máximo do festival. Jarmusch apresentava ainda um documentário sobre a carreira de Iggy Pop.

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Para sua coletiva, Allen apareceu com os atores Kristen Stewart, Jesse Eisenberg, Blake Lively, Steve Carell e na companhia do fotógrafo Vittorio Storaro. “Cafe Society” foi todo filmado com câmeras digitais e Storaro, fotógrafo das melhores imagens gravadas por Betolucci, Coppola e ainda o diretor de fotografia de “Reds” (já tinha até esquecido disso), de Warren Beatty, garantiu que não há mais diferença entre a imagem eletrônica e o registro em celuloide. Allen só vê vantagens, inclusive para uma eventual manipulação das cenas na etapa de pós-produção.

Jarmusch teve coletiva de imprensa para seus dois trabalhos. “Paterson”, que conta a história de um motorista de ônibus que escreve poesias, parece ser mais um dos filmes naive de um diretor que procura retratar aquelas cenas tocantes que, tenta nos convencer, poderiam fazer parte de nosso cotidiano. Jarmusch filma simulando a falta de pressa de quem quer esperar as coisas acontecerem por conta própria. É o que sugerem mais uma vez as cenas disponíveis de seu novo filme.

Já “Gimme Danger” é o tributo de um fã dos Stooges, do MC5 e do Velvet Underground. A estrela da coletiva acabou sendo a própria estrela do filme, Mr. Pop, como foi chamado pelos que se dirigiam a ele, hoje enfrentando a surdez e se tratando com vinho nas refeições, distante portanto das muitas drogas que alimentaram sua criatividade musical no passado (pelo menos é o que diz).

Jarmusch conta que tentou replicar visualmente a anarquia, comicidade e o tom inventivo do trabalho de Iggy Pop e de seus muitos parceiros.  Ex-integrante da banda de No Wave The Del-Byzanteens nos anos 80, com carreira musical com os SQÜRL e assinando trilhas de alguns de seus filmes (inclusive a techno ambience de “Paterson”), Jarmusch sempre trabalhou com músicos (John Lurie, Tom Waits e  o próprio Iggy Pop em “Coffee and Cigarettes”) e já cuidou de um rockumentário em “Year of the Horse – Neil Young and Crazy Horse Live”. Ainda não temos o trailer de “Gimme Danger”, mas Iggy Pop, que não guarda suas velharias, ajudou a recolher material pouco conhecido entre “fãs, drug dealers, colecionadores de gravações piratas” para termos cenas bem além do que está disponível no youtube. É aguardar pelo resultado.

Kleber Mendonça Filho teve o seu “Aquarius” muito elogiado, embora não tenha levado nenhum prêmio. Estava concorrendo com nomes consagrados como Pedro Almodóvar (“Julieta”), atores-diretores de renome como Sean Penn (“The Last Face”) e o jovem canadense mas já queridinho Xavier Dolan (“It´s Only the End of the World”).  Estar na competição, no entanto, é uma vitória e isso não acontecia com um filme brasileiro desde o “Na Estrada”, de Walter Salles, em 2012. O colaborador da Folha de São Paulo em Cannes, Rodrigo Salem, que fazia a cobertura do festival, falou que “Cinema Novo”, filme de Eryk Rocha, que competia na categoria documentário, tinha posto a plateia pra correr da sala Buñuel bem antes do fim de sua projeção. Não se sabe, no entanto, se pela presença de Amir Labaki no corpo de júri de documentários do festival, mas o fato é que o filme do filho de Glauber Rocha acabou levando o prêmio Olho de Ouro. Fiquei interessado em conferir.

Eryk Rocha

Sobre Marcos Pedrosa de Souza

Marcos Pedrosa de Souza é professor da Fundação Cecierj. Tem formação em jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e em letras pela Universidade Santa Úrsula. É mestre e doutor em letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi colaborador de O Globo e de outros jornais e revistas. Foi professor do IBEU, da Cultura Inglesa e da Universidade Estácio de Sá.
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